Postura e Dislexia
Dores musculares, cefaleias, dislexia, vertigens ou fadiga crônica são alguns dos sintomas de problemas de postura, de que um médico português é um dos maiores especialistas mundiais.
É uma questão biológica. Dentre milhares de funções para as quais o cérebro humano está programado, uma delas é saber reconhecer a forma e a volumetria do corpo, bem como a posição exata que este ocupa no espaço. Quase ninguém percebe esta competência inata, mas a sua importância é capital, pois, sem ela, os seres humanos não conseguiriam adequar quaisquer movimentos ao meio envolvente. O que pode acontecer, então, quando algo perturba esta capacidade?
Em Portugal, ninguém melhor para responder a esta pergunta do que Orlando Alves da Silva, oftalmologista, chefe de serviço no Hospital de St.ª Maria, em Lisboa, e um dos grandes impulsionadores de uma disciplina médica emergente, a
Posturologia.
Como explica este investigador, os problemas surgem quando «o indivíduo adopta posturas corporais incorrectas, que embaralham a percepção que o cérebro tem da posição das diferentes partes do corpo».
Ou seja, defasado da orientação espacial do esqueleto e do estado de contração ou relaxamento de vários músculos, o cérebro passa a dar ordens erradas a diversas estruturas do organismo. E as consequências que podem advir desta violação da harmonia biomecânica humana sucedem-se num rol tão variado quanto surpreendente.
OS PRINCIPAIS SINTOMAS
Dores musculares persistentes, cefaleias, nevralgias, vertigens e perdas de equilíbrio, fadiga crónica, dificuldades de concentração, perdas de movimentos, distúrbios da visão e da audição são apenas os sintomas frequentes dos problemas de postura que, globalmente, se designam por
Síndrome da Deficiência Postural (SDP).
O valor que se segue talvez surpreenda a maioria dos leitores, mas, segundo Alves da Silva, «mais de 10% da população portuguesa tem SDP». No entanto, «as pessoas não sabem o que isto é e a maioria dos médicos também não» - o que nem seria grave se estes doentes não perdessem «anos de qualidade de vida em consultas de quase todas as especialidades, sem resolverem o problema».
Embora tenha aperfeiçoado de forma notável o conhecimento e as técnicas de diagnóstico da SDP, é sobretudo pelo seu método terapêutico que Alves da Silva se distingue na linha internacional da investigação em Posturologia. Com uma eficácia que o autor garante ser «superior a 90%», o tratamento aplica-se em duas fases.
Em primeiro lugar, o doente passa a utilizar um tipo particular de lentes prismáticas, que o próprio Alves da Silva desenvolveu. Após a intervenção óptica, o doente deve frequentar sessões de «exercícios de correcção postural», nas quais um técnico de
Ortóptica o reeduca a «andar, permanecer em pé, sentar, deitar e respirar da forma adequada ao restabelecimento do seu equilíbrio postural». Foi assim que António Grilo se recuperou de um problema sem explicação evidente. Há 16 anos, teve de se afastar do trabalho porque «não parava com dores de cabeça, vertigens e vómitos, e não sabia o que aquilo era».
Do médico de família passou para um neurologista, que, sem solução, o encaminhou para um otorrino. Este aconselhou a consulta de Alves da Silva, que lhe diagnosticou uma SDP. Com as lentes prismáticas e os exercícios, «o problema resolveu-se em pouco tempo e nunca mais houve nada».
Mas o exemplo de António Grilo é dos mais simples. À consulta de Alves da Silva também chegam casos desesperados, como o da doente que passou «anos numa cadeira de rodas, a correr todos os serviços e consultas de neurologia de Lisboa», sem que ninguém encontrasse a causa do desequilíbrio permanente que a impedia de se manter em pé. O problema era, afinal, uma SDP grave, cujo tratamento adequado devolveu o equilíbrio e o andar à doente, em poucas semanas.
13 ANOS SEM CONSEGUIR LER
Uma aula de correção:
Do estrangeiro também chegam pacientes. Alguns aproveitam uma passagem por Lisboa, em trabalho ou em férias. Outros vêm de propósito, em último recurso. Foi o caso de um bem-sucedido empresário inglês que, cerca de 13 anos antes de ser tratado em Lisboa, se tornara incapaz de ler, pois a mais breve leitura causava-lhe dores de cabeça que o próprio dizia serem insuportáveis.
Durante este período recorreu a numerosos especialistas e experimentou todas as possibilidades de tratamento de que ia tomando conhecimento, sem resultados. Na primeira consulta com Alves da Silva, este constatou que o doente não conseguia ler por mais de sete segundos - depois disso surgiam as dores. Contudo, bastaram as lentes prismáticas adequadas para que capacidade de leitura fosse restabelecida.
Outro caso é o de Francisco, que teve um desenvolvimento aparentemente normal, em todos os aspectos. Foi para a escola antes de fazer seis anos, mas no fim do primeiro ano não tinha conseguido aprender a ler nada.
Movida por uma suspeita de dislexia, a mãe recorreu ao Centro Psicológico e Terapêutico da Dislexia, em Lisboa, onde lhe foi aconselhada a consulta de Posturologia de Alves da Silva. Nas palavras do médico, Francisco foi um dos casos mais graves de dislexia que teve. De base, havia um problema postural muito sério, que depois foi resolvido com lentes prismáticas e correcção da postura. Segundo a mãe, «os progressos na leitura e na escrita começaram a ser evidentes ao fim de alguns meses». Após um ano de intervenção postural, «o Francisco recuperou completamente o atraso escolar e a dislexia já não se compara ao que era», acrescenta.
DISLEXIA OU MÁ POSTURA?
Mas, qual a relação entre a dislexia e a SDP? Segundo Alves da Silva, «em muitos casos, a SDP diminui a
capacidade de convergência dos olhos, ficando o doente incapaz de fixar o mesmo ponto por períodos de tempo normais». Ou seja, do problema postural decorre uma instabilidade ocular que interfere com a informação visual que chega ao cérebro, tornando-o incapaz de reconhecer determinadas letras e representações gráficas. Nas crianças, uma das possíveis consequências desta «cegueira» selectiva é a dislexia, que, por impedir o bom desenvolvimento da capacidade de leitura, compromete a aprendizagem escolar.
Alves da Silva está convencido de que «em mais de 90% dos casos a dislexia é uma manifestação da SDP». Como tal, «para tratar a dislexia é forçoso corrigir a deficiência postural». É claro que o êxito desta abordagem terapêutica será tanto maior quanto mais cedo for diagnosticada a patologia. Por esta razão, o médico chama à atenção dos pais para os «meninos mais trapalhões, aqueles que estão sempre caindo e tombando objetos, os que mordem a língua sem querer e têm o sono agitado, com pesadelos», já que, na maioria dos casos de SDP, estes são os primeiros sinais visíveis de um problema que permanece pela vida fora.
A CHAVE DO PROBLEMA
Gabriel Elie, oftalmologista francês que dirige a revista «Réalités Ophtalmologiques», explica que, «quando se trata crianças disléxicas através do método Alves da Silva, a transformação que se observa é espetacular. Em algumas semanas, estas crianças com grandes dificuldades na leitura adquirem um ritmo de aprendizagem normal».
Em sua opinião, «depois de décadas de investigação em dislexia, cujos únicos resultados foram várias teorias que se expandiram em todos os sentidos sem chegarem a solução alguma, Alves da Silva deu-nos a chave do problema, explicando a sua causa e indicando um método terapêutico que se distingue pela sua simplicidade e eficácia».
(REF: http://www.pcd.pt)